quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Lourinelson Vladmir - Último Capítulo da Malhação


Hoje depois de dias alienado nas minhas próprias coisas, voltei ao mundo e fiquei sabendo da matéria de capa da Veja sobre as supostas declarações de Valério sobre o mando de Lula no mensalão e me deixei refletir sobre tudo o que envolve este esquema e seu julgamento.

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Há dois tipos de abordagem sobre o tema que me contrariam: a ingênua e a hipócrita maledicente. 

Aos maledicentes, todo meu amor.  São meus adversários, contra eles combato, e lutando me divirto. Todo o meu respeito.

Aos outros, os ingênuos - muitos deles meus amigos! - dedico a paciência, mas às vezes ela me deixa e passo a desejar que lhes atingisse um raio, um atropelamento coletivo; enfim, que a providência divina me poupasse de com eles cansar meu braço e sujar minha adaga, destinada a inimigo mais respeitável.

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Pois bem, eu tenho sido paciente com a ingenuidade recorrente com a qual a população - e muitos amigos - se  referem ao "mensalão", e com o modo tolo de externar decepção com o PT : o balançar consternado de cabeças; a vitimização.

Mas agora com a elevação do Joaquim Barbosa a super-herói tipo Capitão Nascimento, moralizador do Brasil eu cheguei finalmente à irritação e a irritação é a melhor amiga do meu teclado: eu sou um tipo que só escreve quando irritado, pra acabar com a irritação. Minha escrita é utilitária. Escrevo para poder dormir e voltar a me preocupar com meu próprio umbigo e com o que vai logo atrás dele, no que faço muito bem.

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O que hoje poderia me tirar o sono - mas não vai! - é esta novelinha das 5h30, esse tom draminha juvenil que tomou conta do Brasil quando se fala a palavra mensalão. Essa trama menininha invejosa – lembrei do Álvaro Dias, sorry - chamando a outra de vagabunda só porque tá “pegando” o bonitão do segundo ano do colegial.

Quem dá trela pra esse tipo de trama é juvenil. Só não é juvenil a imprensa que conta essa história. Não é nada juvenil; conta a história da vagabunda, piranha, com ares de responsabilidade moral, democrática, pelo fim da promiscuidade: a tradição, a família e a propriedade pelo fim desta putinha.

Quando em 2005 essa história estourou eu confesso que me decepcionei, ou até, posso dizer, me choquei. Mas paradoxalmente também desconfiava de que tais sentimentos tinham um fundo alienado, a-histórico, idealista, juvenil: era a minha juvenice (sic), que estava sob o crivo da minha crítica histórica. Hoje eu me perdoo o romantismo de quem não percebia o imenso buraco político no qual estávamos. Naquela época eu, como muitos, tinha uma imensa decepção quanto às potencias de mudanças mais profundas que não se realizaram como imaginávamos depois de 2003. Então misturei alhos com bugalhos e por pouco não entrei no oba oba dos que pretendiam naquela época fazer da indignação de românticos juvenis como eu a dinamite para implodir o governo Lula.

A onda golpista não vicejou mas o governo diminuiu ainda mais seu ímpeto, que já era fraco e o partido levou seus golpes. Muitos deixaram o PT, indignados. Outros mantiveram a posição. Nunca fui do PT mas apoiei os que ficaram, sem contudo desqualificar os que saíram. Sei que o Dr. Rosinha, deputado do Paraná, foi instado por boa parte do grupo que o apoiava, a sair. Resolveu ficar, e eu, que sempre votei nele, aprovei. Alguns do que saíram formaram o PSOL, que tem ótimas e péssimas jogadas. Uma ótima jogada é ter Freixo como candidato a prefeito do Rio. Votarei nele, agora que voto no Rio. Uma péssima jogada era a ideia esdrúxula de votar no Alkimin contra a reeleição do Lula em 2005: o plano genial seria acabar com o Lula e reestruturar a esquerda em torno do PSOL para a eleição de 2010. Coisa de maluco. É quando a decepção chega ao ressentimento, e daí à estupides.

Pois é, estupides é o que eu revejo agora nesse tom carola de tratar os pecados capitais da política nacional.

Ora, ora, ora, o Brasil sempre viveu um esquemão, um baita esquemão. O Getúlio, que era um sujeito impetuoso, cheio de complexidades, contradições, mas que tinha atitude, visão de Estado e de nação, caiu por conta do esquemão. Rompeu o esquemão café com leite. Sentiu que o esquemão ia voltar e impetuoso manteve à força sua posição. Ditador! Mas depois voltou eleito, aí foi a gota d'água, São Paulo nunca o perdoou. Ditador pode, mas estadista popular, não. Isso não! Essa ligação entre político e massa, essa relação quando se torna assim imprescritível como foi o caso do Getúlio e agora o Lula - embora de modo não idêntico - isso magoa muito a turma que manda no Brasil: Banqueiros, latifundiários, industriais, sociólogos da USP; essa gente que, de onde quer que sej, vai se frequentar em restaurante "fino" de São Paulo.

Enfim, me desculpem as patricinhas que chamam de vagabunda a menina proletária que está fodendo – sorry – com o bonitão do segundo colegial na novelinha das 5: 30h, mas o pano de fundo da trama é: era eu que trepava com ele antes, era eu que deveria estar trepando com ele agora, e, principalmente serei eu, custe o que custar, pouco importa quanta hipocrisia eu tenha de vicejar, que vou “ficar” com ele amanhã. Sendo assim, joga pedra na Geni: É preta, é pobre e é puta também! Desmoraliza ela que o garotão abandona. Ou seja, contam com a hipótese de que ele seja um babaca. Provavelmente é.

Aí eu ouço essa baboseira (ou seria barboseira?) de que este é um momento histórico que vai mudar os rumos da ética política do Brasil. Ah! Santa simplicidade! Mudar o cacete! Tudo permanecerá igual, ou pior, porque meia verdade é pior que uma mentira. No Brasil a conta do jogo político sempre foi 2+2=3; porque 1 escorrega. Era assim, antes do lula, foi assim com lula – lamento - e será assim depois da julgamento do BBB do STF.

Agora neste exato momento tem esquemas de captação de dinheiro acontecendo para financiar campanhas no país inteiro. Dinheiro sem origem fiscal, acumulados em caixa 2 e em valores muito superiores às migalhas que sustentaram este mensalão (sim, porque se a economia do Brasil cresceu desde 2003, os valores de arrecadação de caixa 2 subiram na mesma proporção). Só quando nós admitirmos francamente nossas mazelas estruturais, admitirmos que esta corrupção é estrutural; que começa pelo modo fantasioso como se regulam as campanhas eleitorais, que é um dos pilares no arranjo do poder político brasileiro; só depois desde francamente, nós poderemos pensar numa potência de mudança. Enquanto nos contentarmos com bodes expiatórios tudo permanecerá. Mata o traficante da Rocinha! Nada muda. Óbvio. O problema não é este ou aquele traficante. Malhar traficantes é parte do show da polícia militar, do Bope, ou do STF, que vai esfolar os traficantes do mensalão.

Nós estamos realmente fadados à juvenice não temos talento para a conversa madura, para a sabedoria do ancião. Sempre, sempre juvenis, ingenuamente chocados quando na Veja aparece a denuncia de que 2+2=3, ó que horror! Quando nossa saída seria admitirmos que essa é nossa matemática histórica, antropológica, para a partir dessa constatação de origem, de nosso vício de origem, tentarmos efetivamente, verdadeiramente uma outra matemática que resulte 2+2=5. Porque em política 2+2=4 é uma meia verdade na qual só acreditam os que se emocionam com o capítulo final da Malhação.

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P.s.: sorry, mas vou contar o final: o bonitão - pequeno burguês, filho de proletários, metido a playboy - cai na conversa das patricinhas, termina o namoro com a proleta - que cometeu a juvenice pequeno burguesa de teimar que era santa ao invés descer das tamancas e se assumir uma puta - e volta a ser um solteiro descompromissado e Liberal Democrata! Claro! Tá comendo todo mundo, ou seja, tá comendo ninguém! Olha que maravilha! Só na malhação. Viva o povo brasileiro.


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Agora vou dormir em paz.

Eu amos as putas!
Porque as putas, as putas são de ninguém!
Eu sou ninguém e como as putas
Espero um dia ser a puta de alguém

(Trecho da marchinha de Adriano Petermann e Márcio Matana)